domingo, 14 de dezembro de 2014

Folhas Soltas de Pequenos Retratos



Primeiro Retrato

Escrevo ao relento, deixo que o vento me leve, que o sol me queime, que a chuva me faça escorrer, que tudo se misture e me transforme, porque nada espero, e a cada momento gravo aquilo que me aprisiona, indo onde mais ninguém vai, voando onde ninguém pode chegar, sentindo o que não se pode sentir, vendo que o não se vê com um simples olhar, largo tudo e voam as páginas de uma vida.

Segundo Retrato

- "Sinto falta da força que me levava a percorrer montes e vales, que me levava a escrever, que me fazia levantar quando tudo me fazia cair, daqueles momentos envolvidos na mais suave magia que palpita dentro de mim" diz ele.
- "Mas afinal do que não sentes falta?" pergunta ela. 
Ele responde na sua voz mais suave e meiga, com um pouco de vergonha e tristeza: 
- "Não sinto falta do sentimento que me faz sofrer dia-após-dia"

Terceiro Retrato

Sento-me no chão frio da varanda, acendo um cigarro e bebo um pouco de vinho tinto, observo a noite apenas iluminada pelo doce luar, o meu pensamento divaga, entre imagens tuas e nossas relembro tudo o que foi proferido entre nós, sentindo uma certa ternura, mas relembro que tudo não passou de enganos, mentiras, falsidade, foco-me assim apenas no teu sorriso ao luar, apenas sentindo que tudo poderia ter sido diferente!

Quarto Retrato

Certa vez, perdidos no reino íntimo e húmido do teu quarto agarraste a minha mão com toda a força do teu impulso. Assustaste-me. Puxaste-me para diante do velho espelho do armário de madeira dorida. Lado a lado, obrigaste-me a fixar a nossa imagem, reflectida. Do outro lado, acenavam-nos dois seres aparentemente iguais.
-Vês? - perguntaste-me roucamente emocionada.
-O quê? - retorqui desnorteado pois não entendi o que pretendias.
-A nossa pele resplandece um suave murmúrio de luz...

Quinto Retrato

Tenho uma mística enraizada em mim, a raízes de uma vida de outrora, vida essa alucinante, vivida na experiência do amor. 
- De que falas!? 
Falo de amores e paixões, falo de paredes sussurrantes, de portas entreabertas com olhares distantes, de fantasmas esquecidos às janelas, de fadas despidas de sentimentos escondidas na soalhada de um beco. Esta visão proliferante, esta forma de sentir tão intensa faz-me ver e sentir tudo de uma forma tão diferente tão vivida e sonhadora, faz-me sofrer e esquecer.

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